domingo, 31 de março de 2019

nº 1845 Artigo - “A força da graça”

 Pe. Luiz Carlos de Oliveira 
Redentorista  
2182. Discernimento é graça 
Nosso querido Papa Francisco nos instrui sobre o caminho da santidade. Para isso escreveu a bela exortação apostólica “Gaudete et Exultate” – Alegrai-vos e Exultai (GE). Vamos continuar na reflexão sobre o discernimento. Como somos também espirituais, não somente carnais, refletimos as maravilhas do ser humano, também em sua dimensão espiritual. A Igreja demorou um pouco para assumir as novas ciências. Mas corre o risco de dispensar as ciências espirituais. Assim afirma no documento: “É verdade que o discernimento espiritual não exclui as contribuições de sabedorias humanas, existenciais, psicológicas, sociológicas ou morais; mas transcende-as. Não bastam as normas sábias da Igreja. Lembremo-nos sempre de que o discernimento é uma graça” (GE 170). Embora inclua as ciências, “está em jogo o sentido da minha vida, diante do Pai que me conhece e ama, aquele sentido verdadeiro para o qual posso orientar a minha existência e que ninguém conhece melhor do que Ele... Em suma, o discernimento leva à própria fonte da vida que não morre, isto é, conhecer o Pai, o único Deus verdadeiro e, a quem Ele enviou, Jesus Cristo (Jo 17,3). É um dom sobrenatural. O Papa Francisco insiste que esse dom é dado a todos. Sabemos que os humildes têm grande sabedoria e discernem muito bem os caminhos de Deus, tanto que são eles os destinatários mais imediatos da revelação de Deus, como lemos em Mateus: “Eu Te louvo, ó Pai....porque ocultastes esses mistérios de Deus aos sábios e doutores e os revelastes aos pequeninos” (Mt 11,25). Não porque recuse, mas porque eles estão fechados. Não são pequeninos, nem humildes. 
2183. A força da oração 
Sabemos que o Senhor está sempre a nos falar sempre de muitos modos, através das pessoas, dos acontecimentos, da natureza etc... E continua o Papa dizendo “que não é possível prescindir do silêncio da oração prolongada para perceber aquela linguagem, para interpretar o significado real das inspirações que julgamos ter recebido, para acalmar ansiedades e recompor o conjunto da própria vida à luz de Deus”(GE 171). Agindo assim podemos garantir que vivemos a partir do Espírito de Deus. Essa chamada que recebemos nos ajuda a discernir também nossa vida espiritual. Nem sempre ela corresponde ao que o Senhor espera de nós. E também nos dá a possibilidade de abrir nossa fragilidade numa súplica garantida: “Fala Senhor!” Queremos sempre ouvir o que o Senhor quer falar, mas preferimos escamotear e dar nossas respostas satisfazendo nossos interesses espirituais. É preciso disposição em ouvir. Diz: “Somente quem está disposto a escutar é que tem a liberdade de renunciar ao seu ponto de vista parcial e insuficiente, aos seus hábitos, aos seus esquemas” (GE 172). Quem está disposto a dizer “fala Senhor”, deve estar disposto a ouvir o que pode não estar em nossos projetos pessoais. Deus pode ter coisas melhores. 
2184. Tesouro da Igreja 
Continuando a reflexão, o Papa Francisco lembra que tal escuta é ao Evangelho como último critério e ao Magistério que o guarda, procurando encontrar no tesouro da Igreja aquilo que pode ser mais fecundo para o “hoje” da salvação (GE 173). Não se trata de voltar ao passado como única fonte, pois o Evangelho é vivo hoje. No passado essas respostas eram atuais. Hoje temos outras situações. A rigidez está fora do caminho do Espírito que nos foi dado pelo Ressuscitado. É sempre um hoje. Isso pode nos levar a fugir da realidade para viva do Evangelho e do Espírito que fala à Igreja. Ele é força e graça.

quarta-feira, 27 de março de 2019

nº 1844 Homilia do 4º Domingo da Quaresma (31.03.19)

Pe. Luiz Carlos de Oliveira 
Redentorista 
“E começaram a festa” 
 Alegria da salvação 
A tônica da celebração de hoje é a alegria que já está anunciada na antífona de Entrada: “Alegra-te Jerusalém!... Vós que estais tristes, exultai de alegria. Saciai-vos com a abundância de suas consolações”. Esse quarto domingo é chamado de “Laetare” é o domingo da alegria, como lemos também no terceiro domingo do Advento. São os primeiros raios da alegria da festa que se aproxima, como lemos na oração da missa: “Concedei ao povo cristão correr ao encontro das festas que se aproximam, cheio de fervor e exultando de fé”. Podemos ver essa alegria na parábola do Pai amoroso e o filho perdido que chamamos de “filho pródigo” quando diz ao irmão que “era preciso festejar e alegrar-nos, porque este teu irmão estava perdido e foi encontrado” (Lc 15,32). A parábola do Pai amoroso nos traduz bem o sentido da redenção: O homem perdido pelo pecado, caído na extrema miséria, cai em si mesmo e se vê necessitado de salvação. O Pai envia o Filho para buscar a ovelha perdida. Cristo trabalha o coração do homem para que vá para Deus. O Pai é como o pai da parábola. Espera a criatura que se perdeu. Ansioso manda tantos meios de redenção. Se o homem vai ao profundo da miséria é para pensar na riqueza de vida da casa do Pai. Por mais que seja profunda sua situação pecadora, não haverá jamais um obstáculo para o retorno à casa paterna. Ele é filho, faz parte da família. O irmão que não o quer receber são aqueles que não aceitam que o Pai seja generoso, como é o caso dos fariseus que negavam a Jesus o direito de acolher os pecadores. Essa é a alegria de Jesus.
Nova criatura 
Paulo nos escreve: “Se alguém está em Cristo, é uma criatura nova. O mundo velho desapareceu. Tudo agora é novo. E tudo vem de Deus, que por Cristo nos reconciliou consigo e nos confiou o ministério da reconciliação” (2Cor 5,17-18). A reconciliação realiza o grande desígnio de Deus de redenção. Em Cristo fomos reconciliados com o Pai. Mais ainda: Deus nos confiou esse ministério de reconciliação para levarmos tantos a serem novas criaturas. Diz o Apóstolo Paulo: “Em nome de Cristo suplicamos: ‘Deixai-vos reconciliar com Deus” (2Cor 5,20). É importante sabermos que estamos, depois de reconciliados com Deus, em união ao ministério de Reconciliação de Jesus colaborando na reconciliação dos homens. Deus quer precisar de nós para essa missão. Ser nova criatura é ter a vida nova que nos foi dada pela Ressurreição de Cristo e unir-nos ao Cristo que está sempre em missão no mundo. Por isso, a última ordem de Jesus foi: “Ide por todo mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,15). 
Terra nova 
Com a entrada na terra prometida realizou-se a promessa feita a Moisés de libertar o povo e conduzi-lo a uma terra onde manam leite e mel (Ex 3,8).Toda caminhada no deserto, passando para muitos sofrimentos foi para atravessar o Jordão e entrar na terra prometida. O povo de Deus celebra a Páscoa na terra prometida. Já comem os produtos da terra. Tudo é novo. Não vivem mais do milagre do Maná que deixou de cair do Céu. Puderam comprovar quão suave é o Senhor (Sl 33). A conquista da terra simboliza o novo mundo onde os fiéis redimidos vivem. A Páscoa de Jesus abre também a vida em uma terra nova, a do alto, para onde foi conduzido o povo dos redimidos. É a festa que o Pai oferece pela chegada do filho recuperado. É a vida do alto onde vivem as novas criaturas que passaram o mar das águas do Batismo e participam com Cristo da festa que o Pai oferece. 
Leituras: Josué 5,9ª.10-12; Salmo 33; 2 Coríntios 5,17-21; Lucas 15,1-3.11-32 
Ficha nº 1844 - Homilia do 4º Domingo da Quaresma (31.03.19) 
1. A tônica da celebração é a alegria da salvação do Pai que acolhe o filho perdido. 
2. Recebemos a reconciliação e participamos de sua obra. 
3. A entrada na terra prometida é o prenúncio da redenção que nos dá um novo mundo.
Essa festa eu não perco 
O domingo é de festa. Os judeus chegam à terra prometida. O pai bondoso dá uma festança para o filho que volta depois de ter gasto tudo o que tinha recebido de herança. As criaturas são novas. É festa para todo gosto. Eu não vou perder nenhuma. Não sou judeu, mas, se estamos aqui foi porque estiveram lá. Não somos perdidos, mas aproveitamos a alegria do pai. E somos novos, podemos aproveitar bem as festas. A festa da Páscoa resume todas essas festas e ainda propõe outras mais. Fazer a Páscoa é abrir um calendário de festas. A alegria da festa permanece, pois é festa que domina o coração e não é somente exterior. O coração alegre alegra um corpo inteiro.

nº 1843 Artigo - “O Espírito discerne”

Pe. Luiz Carlos de Oliveira 
Redentorista 
2176. A Sabedoria que educa 
Em sua reflexão sobre o caminho da santidade na Exortação Gaudete et Exultate, o Papa Francisco nos auxilia a grande verdade do discernimento. Não se trata em resolver os grandes problemas que nos atingem, mas também as pequenas questões de nossa vida. Como estamos sempre envolvidos em tantas solicitações e vivemos tantos contatos, podemos nos perder no secundário e no prejudicial. Diante dessas realidades, o Papa faz a pergunta: “Como é possível saber se algo vem do Espírito Santo ou se deriva do espírito do mundo e do espírito maligno? A única forma é o discernimento” (GE 166). É um dom que devemos pedir, pois Deus quer nos oferecer sempre uma vida plena, mesmo nas pequenas coisas do dia a dia. É certo que nossa capacidade espiritual já tem elementos suficientes para o bem viver. Contudo, diante das realidades presentes que se aceleram, precisamos do dom do discernimento. “Se o pedirmos com confiança ao Espírito Santo e, ao mesmo tempo, nos esforçarmos por cultivá-lo com a oração, a reflexão, a leitura e o bom conselho, poderemos crescer nesta capacidade espiritual” (GE 166). A vida que levamos parece tão normal. Mas vivemos um perigo grande de nos tornamos escravos da situação e nos tornarmos marionetes. “Hoje em dia, tornou-se particularmente necessária a capacidade de discernimento, porque a vida atual oferece enormes possibilidades de ação e distração, sendo-nos apresentadas pelo mundo como se fossem todas válidas e boas. Todos, mas especialmente os jovens, estão sujeitos a um zapping constante” (GE 167). 
2177. Guardar o que é bom 
Devemos tirar da mente que exista um contínuo duelo entre Deus e o “diabinho”. O que nos move ao mal está em nós mesmos como restos do pecado original. São tendências contra as quais temos que lutar. O discernimento nos ajuda não só a vencer o mal, mas também a desbloquear a tendência que temos de nos acomodar e não assumirmos novidades que nos farão crescer no serviço ao mundo. O discernimento nos ajuda a sair da rigidez mental ou espiritual. Assim nos diz o Papa Francisco: “Noutras ocasiões as forças do mal nos induzem a não mudar, a deixar as coisas como estão, a optar pelo imobilismo e a rigidez e, assim, impedimos que atue o sopro do Espírito Santo” (GE 168). Dizemos que não temos lideranças novas no mundo. O motivo é a falta de discernimento do chamado do Espírito. “Somos livres, com a liberdade de Jesus, mas Ele nos chama a examinar o que há dentro de nós – desejos, angústias, temores, expectativas – e o que acontece fora de nós – os “sinais dos tempos”, para reconhecer os caminhos da liberdade plena: “examinai tudo, guardai o que é bom” (1Ts 5,21) (GE 168). O Espírito nos desamarra de nossos egoísmos. 
2178. Sempre à luz do Senhor
“O discernimento... é um instrumento de luta, para seguir melhor o Senhor. É sempre útil, para sermos capazes de reconhecer os tempos de Deus e a sua graça, para não desperdiçarmos as inspirações do Senhor e não ignorarmos o seu convite a crescer”. Temos a ideia de que bons são os grandes e os heróis. O que decide em nossa vida são as pequenas coisas. São os tijolos que, feitos de pequenos grãos, fazem as grandes construções. “Por isso, escreve o Papa: peço a todos os cristãos que não deixem de fazer cada dia, um diálogo com o Senhor que nos ama, um sincero exame de consciência. Ao mesmo tempo, o discernimento leva-nos a reconhecer os meios concretos que o Senhor predispõe, no seu misterioso plano de amor, para não ficarmos apenas pelas boas intenções” (GE 169).

sexta-feira, 22 de março de 2019

nº 1842 Homilia do 3º Domingo da Quaresma (24.03.19)

Pe. Luiz Carlos de Oliveira 
Redentorista 
“Eu vi a aflição de meu povo!” 
 Um Deus presente 
As Sagradas Escrituras usam muitos símbolos para explicar a Palavra de Deus. A árvore que produz fruto significa o fiel crente em Deus que, plantado à beira d’água tem vida e produz abundantes frutos. Deus cobra bons resultados. Escolhera para Si um povo para que pudesse levar adiante a grande obra da salvação. Ele sempre toma a “iniciativa”, como lemos na manifestação de Deus a Moisés no monte Horeb (Ex 3,1-8ª.13-15). Ali o chama a assumir a missão de tirar o povo do Egito, onde os filhos de Abraão, os judeus, sofriam horrível escravidão. Porque fizera a promessa aos pais (Abraão, Isaac e Jacó), não os abandona. Assim é toda sua história: sempre, em seus sofrimentos, é libertado por Deus de modo maravilhoso. É um Deus presente, não porque o povo mereça, mas porque há uma aliança que sustenta essa vontade salvadora. É o que rezamos no salmo: “O Senhor é indulgente e favorável, é paciente, é bondoso e compassivo. Quanto os céus por sobre a terra se elevam, tanto é grande seu amor aos que O temem” (Sl 102). Mesmo que o povo se distancie por seus pecados, Deus não se cansa de perdoar: “Ele te perdoa toda a culpa e cura toda a tua enfermidade; da sepultura Ele salva a tua vida e te cerca de carinho e compaixão” (Id). Se grandiosa foi a libertação do Egito, grandiosa deveria ser a correspondência. Vivemos esse momento de Quaresma refletindo sobre os caminhos de Deus na história do povo. É momento de certificar que estamos nessa história e repetimos a correspondência a que fomos chamados. A Palavra de Deus se faz plena em nós. 
Deus desceu e viu 
As Escrituras afirmam que as manifestações de Deus são sempre gestos de libertação, sobretudo dos fracos e humildes. É um Deus que liberta e salva. Em suas escolhas está sempre embutido um gesto de libertação. “O Senhor é bondoso e compassivo” (Sl 102). É certo que preferimos um Deus vingativo. Certamente em relação aos outros. Somos maus e queremos colocar em Deus nossos sentimentos. A revelação de Deus a Moisés demonstra sua decisão sobre os sofredores no Egito: “Eu vi, ouvi, desci para levar o povo para uma terra boa”. A atitude de Deus para com o povo se repete em tantos momentos da história. A própria encarnação de Jesus é, em vista da redenção da humanidade de um Egito, muito pior que é a escravidão do pecado. Seu nome reflete o pensamento “Deus é salvação”. A parábola do bom samaritano retoma o caminho de Deus: “Viu o homem caído, desceu do seu cavalo, cuidou do homem e levou para a hospedaria, e prometeu voltar para cuidar” (Lc 10,25-37). Quem acolhe o Evangelho acolhe também a mentalidade de Deus expressa na história e manifestada em Jesus. Deus cobra de nós atitudes iguais. A figueira que não produz fruto deve ser arrancada. Deus ainda é paciente, dá os auxílios necessários. Mas, se não dermos frutos, poderemos ser cortados (Lc 13,9). 
Cuidado para não cair 
Paulo é muito claro dizendo que dos judeus que saíram do Egito depois de verem os milagres de libertação que Deus fizera por eles, na passagem do Mar Vermelho e no deserto, não entraram na terra prometida por causa de seus pecados de murmuração contra Deus. E diz: “Quem julga estar de pé, tome cuidado para não cair” (1Cor 10,1-12). A escolha de Moisés, homem fraco, que nem falava direito, abre para nós possibilidades imensas de produzirmos frutos de salvação para o mundo. Deus escolhe o que é desprezível para confundir os fortes, como o fez com Maria, com os apóstolos e nós hoje. 
Leituras: Êxodo 3,1-8ª.13-15;Salmo 102; 
1Coríntios 10,1-6.10.12; 
Lucas 13,1-9
Ficha nº 1842 - Homilia do 3º Domingo da Quaresma (24.03.19) 
1. Se grandiosa foi a libertação do Egito, grandiosa deveria ser a correspondência. 
2. Quem acolhe o Evangelho acolhe a mentalidade de Deus manifestada em Jesus. 
3. Não repitamos o erro dos judeus que murmuraram e não entraram na Terra prometida.
Limpando o jardim 
Deus deu ao homem o cuidado do Jardim do Paraíso. Com o pecado fica responsável de deixar em dia seu jardim interior que é o paraíso de Deus (Sto. Afonso). Deus quer fruta boa, como Jesus buscou frutos numa figueira, fora do tempo. Sempre quer os frutos de nossa dedicação ao Evangelho na comunidade. Ele continua bondoso, dando ainda chances para chegarmos em uma terrinha ao pé dá árvore de nossa vida para que possamos produzir fruto. Não esperemos que sejamos cortados. Muito fez por nós. Espera que correspondamos. Deus faz milagres, mas das possibilidades que nos deu, cuidemos nós. A Quaresma é a oportunidade que temos de levar adiante nossa caminhada de libertação do mal e da produção de frutos sadios para a mesa do mundo.

nº 1841 Artigo - “Força e resistência”

Pe. Luiz Carlos de Oliveira 
Redentorista 
2173. Mais espertos que o maligno 
Estamos refletindo com o Papa Francisco sobre a santidade cristã. Ele nos deu a bela orientação em sua Exortação Apostólica chamada “Alegrai-vos e exultai” – Gaudete et exultate”. Vimos a questão do Maligno que pode nos atrapalhar muito nesse caminho. Refletiremos agora sobre os caminhos da vitória.Temos inimigos, para serem vencidos. Estamos confiantes, pois há tantos homens e mulheres que vivem essa situação e são vitoriosos. Ninguém é tentado acima de suas forças (1Cor 10,13). O Papa nos anima a estar despertos e confiantes. E escreve: “A Palavra de Deus convida-nos, explicitamente, a resistir ‘contra as maquinações do diabo’ (Ef 6,11) e a ‘apagar todas as setas incendiarias do maligno”’ (Ef 6,16) (GE 162). A luta continua. Todo caminho de santidade é uma luta constante. Já dizia Jó (Jo 7,30). Estamos acostumados a ouvir que, o que o Maligno deseja é justamente que desconheçamos sua presença. Ele não tem as armas que temos, pois “para a luta, temos as armas poderosas que o Senhor nos dá: a fé que se expressa na oração, a meditação da Palavra de Deus, a celebração da Missa, a adoração eucarística, a reconciliação sacramental, as obras de caridade, a vida comunitária, o compromisso missionário” (Id). São armas que estão ao alcance de todos e bem perto de nós. Como podemos dizer: perde a luta quem quer. Os males aumentam em nós na medida em que deixamos de usar os meios comuns da vivência da fé. Não precisamos de grandes arroubos de santidade. Bastam as coisas simples da vida cristã que abandonamos.
2174. Crescimento do amor
“Neste caminho, o progresso no bem, o amadurecimento espiritual e o crescimento do amor são os melhores contrapesos ao mal” (GE163). O Papa Francisco nos dá receitas simples para vencer o mal. Uma doença se cura com a saúde. Um corpo sadio tem melhor recuperação. O amor é a saúde do fiel em suas batalhas. É preciso crescer. O que mais derrota é justamente a infantilidade espiritual. Como o corpo cresce, o espiritual também deve crescer. “Ninguém resiste... se se contenta com pouco, se deixa de sonhar com a oferta de maior dedicação ao Senhor; e, menos ainda, se cai num sentido de derrota” (Id). Descreve então que há exigências: “O caminho da santidade é uma fonte de paz e alegria que o Espírito nos dá, mas, ao mesmo tempo, exige que estejamos com “as lâmpadas acesas”(Lc 12,35). Pois, quem não se dá conta de cometer faltas graves contra a Lei de Deus, pode deixar-se cair numa espécie de entorpecimento ou sonolência e permaneçamos vigilantes: “Afastai-vos de toda a espécie de mal” (1Ts 5,22); “vigiai” (Mt 24, 42)...A tibieza que pouco a pouco se vai apoderando da sua vida espiritual a leva a ficar corroída e corrompida” (GE 164). 
2175. Corrupção espiritual 
“A corrupção espiritual é pior que a queda dum pecador, porque se trata duma cegueira... em que tudo acaba por parecer lícito: o engano, a calúnia, o egoísmo o egocentrismo, já que “também Satanás se disfarça em anjo de luz” (2C 165). Jesus alerta-nos contra esta tentação insidiosa que nos faz escorregar até à corrupção: “Quem está de pé, veja de não cair” (1Cor 10,12). O Papa Francisco escolhe uma temática simples. Às vezes nos sentimos grandes demais em nossa sabedoria e acabamos fazendo o que fazem os que tem pouca instrução. O orgulho é um mal que nos leva a tantos males.

segunda-feira, 11 de março de 2019

nº 1840 Homilia do 2º Domingo da Quaresma (17.03.19)

Pe. Luiz Carlos de Oliveira 
Redentorista 
“Participar das coisas do Céu"
 Alimentai nosso espírito
A Quaresma tem um ritmo rico que nos mostra como viver a fé cristã, e qual é o resultado de nosso empenho e da graça de Deus sempre presente em nossa vida. Nessa Quaresma teremos a reflexão sobre as alianças de Deus com seu povo. Essas alianças têm sua máxima realização na pessoa de Jesus, em seu mistério Pascal, de sua morte e ressurreição. O primeiro domingo nos trouxe as tentações de Jesus. A tentação fez parte da vida de Jesus e faz parte da vida de seus discípulos que somos nós. Deixou um sentido de impotência ou risco diante do mal. No evangelho do segundo domingo temos o resultado da vitória sobre o mal por termos seguido Jesus. Ele sobe o monte e Se transfigura diante de seus discípulos. Essa cena maravilhosa nos remete à Ressurreição que nos anima na vitória contra o mal. Ali estão presentes Elias e Moisés, simbolizando a profecia e a lei. A nuvem envolve os discípulos. Significa a presença de Deus que dá garantia à missão do Filho. Não mais Moisés nem Elias serão os mestres do Povo, mas, de ora em diante, devem escutar o Filho: “Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutai o que Ele diz” (Lc 9,35). Na oração da missa pedimos: “Alimentai nosso espírito com a vossa Palavra”. Abraão sentiu esse alimento na aliança que Deus fez com Ele prometendo uma grande descendência. Abraão vê a glorificação na multidão dos filhos como estrelas. Jesus mostrou sua glória como Pedro nos lembra em sua carta: “Pois Ele recebeu de Deus Pai honra e glória, quando uma voz vinda da sua glória lhe disse: ‘Este é meu Filho amado, em quem me comprazo’. Esta voz lhe foi dirigida do céu, ao estarmos com Ele no monte Santo” (2 Pd 9,17-19). 
Purificar o olhar da fé 
A fé não é somente o conhecimento espiritual de verdades eternas, mas exerce o papel purificador de nossa vida, de modo particular no modo de ver o mundo em todas suas realidades. Como estamos na Quaresma entendemos que o tempo é propício para revisar as muitas realidades que nos atingem. É tempo de purificação. Rezamos na oração da missa (coleta) “que seja purificado o olhar da nossa fé”. Esta nos levará a compreender que a fé não nos foi transmitida através de fábulas sutis, como nos diz Pedro, mas por termos sido testemunhas oculares de sua majestade (2 Pd 9,16), Na narrativa da aliança de Abraão, prometendo uma descendência, é realizado um sacrifício purificador, queimado com o fogo da presença de Deus. “Um braseiro fumegante e uma tocha de fogo passaram entre os animais divididos” (Gn 15,17). Purificar o olhar da fé é ver o mundo com os olhos de Deus, que são de misericórdia frutuosa. Ela gera filhos e um novo mundo, simbolizado na terra prometida: “Aos teus descendentes darei esta terra, desde o Egito ao Eufrates” (Id 18). 
Visão da glória 
Paulo em sua carta aos Filipenses nos ensina como vai se realizar a transformação de nosso corpo. Afirma primeiro que “somos cidadãos dos Céus, de onde aguardamos o nosso Salvador” (Fl 3,20). A condição não é uma dolorosa conquista de um futuro distante, mas o gozar desde já uma futura e garantida situação completamente renovada. Essa mudança se dá na “transformação de nosso corpo humilhado que Ele transformará semelhante ao seu corpo glorificado” (Id 21). Essa mudança Ele a fará “com o mesmo poder que tem de sujeitar a si todas as coisas” (id). Nessa condição estamos vivendo a aliança de Cristo Ressuscitado. Ele é transformado, não num brilho transitório, mas definitivo de glória. Por isso estamos na visão de sua glória, desde já, pois mudamos o mundo. 
Leituras: Gênesis 15,5-12.17-18; Salmo 26;Filipenses 3,17-4,1;Lucas 9,28b,36. 
Ficha nº 1840 - Homilia do 2º domingo da Quaresma (17.03.19) 
1. Alimentai nosso espírito com a vossa Palavra. 
2. Purificar o olhar da fé é ver o mundo com os olhos de Deus. 
3. Por isso estamos na visão de sua glória, desde já, pois mudamos o mundo. 
Trocando de roupa 
Quando vemos uma pessoa vestida de padre, freira ou co uma túnica, temos sempre uma memória de santidade. Mas a roupa não faz o monge. Mas a gente não se desliga desse sinal exterior. Há os que pensam que a roupa e outros, os fazem melhores que os outros, tanto na Igreja, como nos negócios etc... Mas Jesus foi mais claro e quer que demonstremos a santidade pelas obras. Nada de lobo vestido de ovelha. Então vemos que Jesus tem essa modificação exterior quando deixa vir fora seu interior que era sua união ao Pai. Ele fez isso para que os discípulos não vissem em sua humanidade destruída pela morte como um fim. Sabiam que Ele era mais do que se via. A nós é dada a direção para nossa vida: que nossas boas obras sejam nossa roupa que faz brilhar o Deus que está em nossa vida.

quinta-feira, 7 de março de 2019

nº 1839 Artigo - “A luta contínua”

Pe. Luiz Carlos de Oliveira 
Redentorista 
2170. Luta permanente 
Iniciamos a leitura do capítulo V da Exortação Apostólica - Gaudete et Exultate - de Papa Francisco sobre a santidade. Nela o Papa analisa o processo da santidade à qual somos chamados. Esta Exortação nos ensina como viver. Constata que “a vida cristã é uma luta permanente. Requer-se força e coragem para resistir às tentações do demônio e anunciar o Evangelho” (GE 158). Não é peso, mas é um esforço organizado para libertar-nos dos males e organizar a vida espiritual a partir da graça. Esta deve penetrar a vida e orientar as atitudes. O Papa aprofunda o conhecimento dessa batalha dizendo que não “se trata apenas de uma luta contra o mundo e a mentalidade mundana”. Não é também a luta contra a própria fragilidade e defeitos. “Mas é a luta constante contra o demônio, que é o príncipe do mal” (GE 159). Dizem que a grande vitória do demônio é convencer-nos de que ele não existe. Essa vitória é possível. Jesus dizia que “via Satanás cair do céu como um relâmpago” (Lc 10,18). Claro que essa questão não está ligada ao modo como estamos acostumados a ver apresentado Satanás. Sua personificação pode prejudicar a compreensão do mal que nos cerca e nos invade. Vemos através da história quantas figuras temos de tentador, a partir da serpente que tentou Eva. Fazemos caricatura do diabo, mas ele continua sua ação no mundo usando os filhos de Deus. Corremos o risco de ficarmos no folclórico a respeito do Maligno e descuidarmo-nos de sua realidade e ação no mundo. As tentações de Jesus mostram claro que o mal nos ataca através do ter, do poder e do prazer. 
2171. Remédio para a carne 
Rezamos no Pai Nosso professando a existência do mal que nos cerca: “Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do Maligno” (ou do mal) (Mt 6,13). Na Ceia Jesus reza: “Não peço que os tires do mundo, mas que os guarde do Maligno (ou do mal) (Jo 17,15). Jesus sofreu a tentação, como lemos na carta aos Hebreus: “Ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado” (Hb 4,15). Não se trata de um mito ou de um folclore. Faz parte da condição humana passar pela tentação do mal. O Papa Francisco chama atenção: “Não admitiremos a existência do demônio, se nos obstinarmos a olhar a vida com critérios empíricos e sem uma perspectiva sobrenatural” (GE 160). Como entender o mal que praticamos, que destrói tanta gente, somente como questões humanas? O combate com o “inimigo” não se faz somente com instrumentos humanos, mas com a força da graça. A tentação é forte. Por isso somos chamados à prática espiritual como dizia Jesus: “tem certo tipo de demônio que só com muito jejum e oração pode ser tirado” (Mt 17,21). O empenho na caridade ocupa nosso tempo, fortalece nossa disposição e nos leva a vencer os males: “Se teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer, se tiver sede, dá-lhe de beber....Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem” (Rm 12,20-21). 
2172. Sabor da fruta 
A tentação tem sabor agradável e desperta desejos dos olhos (Gn 3,6). São Pedro diz em sua carta que o adversário ”como um leão a rugir, anda a rondar-vos, procurando a quem devorar. Resisti-lhe firmes na fé” (1Ped 5,8-9). O Papa Francisco lembra: “Então, não pensemos que seja um mito, uma representação, um símbolo, uma figura ou uma ideia” (GE 161). Encontramos a tentação no belo jardim de Deus que é o mundo. Deus disse a Caim: “Se praticares o bem, sem dúvida alguma poderás reabilitar-te. Mas se procederes mal, o pecado está a tua porta, espreitando-te; mas tu deverás dominá-lo” (Gn 4,7).

sexta-feira, 1 de março de 2019

nº 1838 - Homilia do 1º Domingo da Quaresma (10.03.19)

Pe. Luiz Carlos de Oliveira 
Redentorista 
“Sacramento da Quaresma” 
Eis o dia da salvação 
Iniciamos com a Quarta-Feira de Cinzas o tempo Pascal. Como preparação para a Páscoa temos a Quaresma. São 40 dias de reflexão e exercícios espirituais. Já tivemos um tempo com jejuns e penitências. Mas a renovação do coração é o fundamental. Por isso Paulo conclama na Segunda Coríntios,: “Eis agora o tempo favorável por excelência. Eis agora o dia da salvação” (2Cor 6,2). É o Hoje de Deus. Deus nos oferece a graça através dos meios sensíveis que praticamos. No texto original latino está escrito: “Per annua quadragesimalis exercitia sacramenti” – “pelas práticas anuais do sacramento quaresmal”. A tradução do missal diz: “ao longo dessa Quaresma”. Significa, ao certo, que na Quaresma recebemos a purificação e a santificação através dos símbolos que ela apresenta. Por isso podemos ouvir a chamada: “Eis o dia da salvação”. A reflexão primeira é a tentação de Jesus no deserto que nos faz perceber a realidade da tentação e os instrumentos para vencer essa batalha. O número quarenta, do qual vem o nome Quaresma (quadragessima die – quarenta dias), significa um tempo completo da ação de Deus e da resposta humana. Esse número se repete na travessia do deserto, no jejum de Jesus, na duração do dilúvio e outros. Mesmo que a sociedade não tenha mais a Quaresma como parte de sua vida (o carnaval não falha), a comunidade deve organizar-se para que possa preparar a celebração da Páscoa. Essa é a meta da Quaresma. Depois da Páscoa teremos sete semanas para beber dessa fonte e comer desse banquete que a Sabedoria nos oferece. 
Meu pai era um arameu errante 
Abrindo a temática quaresmal que vai culminar na Páscoa, temos a história que nos conta como Deus encaminhou seu povo. Desde a escolha de Abraão até a introdução na terra prometida. Como Páscoa é libertação de toda escravidão, o judeu fiel lembra que foi guiado por Deus e, sobretudo, libertado da escravidão. O mistério de Cristo se torna presente na comunidade como escolha de Deus e a libertação para introduzir num mundo novo que é a vida de Cristo em nós. Não podemos viver a Quaresma somente a partir dos exercícios espirituais que ficam sem efeito se não há uma finalidade: libertação do mal para a ressurreição em Cristo. Essa ressurreição, como vamos ler na carta de S. Paulo aos Colossenses no dia de Páscoa, está em buscar a vida do alto, pois morremos e nossa vida está escondida em Cristo (Cl 3,1-4). A vida do alto é a terra prometida por Cristo. A profissão de fé do judeu compreendia uma vida doada, simbolizada nos dons oferecidos, e oferta dos dons como reconhecimento. A vida cristã é um contínuo ofertar-se em Cristo participando de sua entrega ao Pai e reconhecendo sua ação em nós. Nossa história cristã está unida à presença de Cristo que se fez presente entre nós como Salvador. Por isso percorremos a história do povo de Deus para fazer o mesmo caminho, agora em Cristo. 
Crendo com o coração 
Paulo nos oferece uma reflexão sobre a força da Palavra que vivemos. “Ela está perto de ti, em tua boca e em teu coração” (Rm 10, 8). Acolhemos a Palavra e a proclamamos como salvação: “Se, com tua boca confessares Jesus Cristo como Senhor e, no teu coração, creres que Deus o ressuscitou dos mortos serás salvo” (id 9); A fé não é somente um som de palavras, mas é o som do coração concorde com a verdade de Deus, e que deve ser também nossa verdade. A caminhada para a Páscoa nos põe em conversão e coerência de vida com o Evangelho que acreditamos e assumimos como vida. Não bastam os ritos. É preciso fé. 
Leituras: Deuteronômio, 26,4-10; Salmo 90; Romanos 10,8-13; Lucas 4,1-13. 
Ficha nº 1838 - Homilia do 1º Domingo da Quaresma (10.03.19) 
1. A Quaresma realiza a santificação pascal que nos introduz no mistério de Cristo. 
2. A profissão de fé do judeu traz sua história e sua entrega a Deus nos seus dons. 
3. Crer nos orienta nesse tempo quaresmal e realiza em nós o que se proclama. 
Malhação espiritual 
Estamos no tempo quaresmal. Fazemos exercícios espirituais para podemos estar prontos para a Páscoa. Muitos malham para ficar com o corpo em condições. O exercício espiritual prepararmos nosso corpo espiritual para celebrar saudáveis a festa para Deus. Fazemos todos os exercícios: corremos pressurosos ao encontro do Senhor. Dobramos nosso organismo para que seja forte para levar com Ele o peso da cruz e da glória. Tiramos a dormência de nossos membros para que sejam dominados pelo Espírito Santo. Equilibramos nossa comida para estarmos com o corpo espiritual saudável. Extirpamos tudo o que nos entorpece para correr com força e agilidade ao encontro das promessas que nos esperam.

nº 1837 Artigo - “Oração é caminho de santidade”

Pe. Luiz Carlos de Oliveira
Redentorista 
2167. É bom rezar 
Falamos muito da necessidade da oração. Mas os orantes são poucos. Sentimos uma permanente necessidade de rezar e muito. É o que dizemos. O que fazemos? Sabemos rezar? Faltam mestres de oração. Para mim o Papa Francisco é um mestre de oração. Refletindo sua Exortação Apostólica Gaudete et Exultate, passamos a compreender a importância que dá à oração. Diz ele: “Lembremos que a santidade é feita de abertura habitual à transcendência, que se expressa na oração e na adoração. O santo é uma pessoa orante que tem necessidade de se comunicar com Deus” (GE 147). Pela experiência pessoal e pelo contato com muitas pessoas, podemos dizer que não sabemos rezar. E, o que aparece por aí, não responde a um projeto de santidade na oração. O Papa lembra S. João da Cruz que recomendava que se procurasse “andar na presença de Deus”, cada um a seu modo (GE 147). Não se trata de ficar falando a Deus, mas deixá-Lo falar. “Trata-se do desejo de Deus que não pode deixar de se manifestar em nossa vida diária: “procura que a tua oração seja contínua e, no meio dos exercícios corporais, não a deixes. ‘Quando comes, bebes, conversas com outros, ou em qualquer outra coisa que faças, sempre deseja a Deus e prende a Ele o teu coração”’ (GE 148). Como ensina S. Teresa, para que tenhamos essa oração permanente, não falação permanente, “são necessários também alguns tempos dedicados só a Deus, na solidão com Ele...É uma relação íntima de amizade, permanecendo muitas vezes a sós com quem sabemos que nos ama” (GE 149). 
2168. No silêncio da vida. 
Vivemos em contínuo rumor. Precisamos estar sempre no barulho. Podemos viver no meio da multidão em silêncio e também estar sozinhos com a multidão dentro de nós. O silêncio interior é uma conquista dolorosa. O Papa Francisco explica: “A oração confiante é uma resposta do coração que se abre a Deus face a face, onde são silenciados todos os rumores para escutar a voz suave do Senhor que ressoa no silêncio” (EG 149). É um processo difícil que exige que nos esforcemos para cortar um pouco os rumores externos e estarmos atentos em ouvir os necessitados. Assim somos capazes de silenciar “outras coisas”. Nossos pecados fazem muito barulho. “No silêncio, é possível discernir, à luz do Espírito, os caminhos de santidade que o Senhor nos propõe” (GE 150). É preciso deixar-se contemplar por Deus. Deus nos olha silenciosamente amando-nos. Contemplá-Lo recompõe nossa humanidade, afirma o Papa. Não se trata de um silêncio que nos tire do mundo, mas nos leve a ouvir e ajudar os necessitados a terem sentido. Nossa história faz parte desse silêncio. A memória agradecida, como ensina Santo Inácio, nos faz inteiros.
2169. O humano da oração 
A oração é também súplica, pois é “expressão do coração que confia em Deus, pois sabe que sozinho não consegue... A súplica de intercessão tem um valor particular, porque é um ato de confiança em Deus e, ao mesmo tempo, uma expressão de amor ao próximo” (GE 154). A oração é também adoração, reconhecendo-O. O coração humano encontra Deus na leitura orante da Palavra de Deus. Ela tem força de vida. Ela nos transforma. Cheios da Palavra, abrimos espaço para a Eucaristia. A Palavra se faz pão. “E, quando O recebemos na Comunhão, renovamos a nossa aliança com Ele e consentimos realizar cada vez mais a sua obra transformadora”, diz o Papa Francisco.

nº 1836 Homilia do 8º Domingo Comum (03.03.19)

Pe. Luiz Carlos de Oliveira 
Redentorista 
“O tesouro do coração” 
Conselhos que dão vida Jesus descera da montanha com os apóstolos e encontrou os discípulos e a multidão que acorrera de todos os lados para ouvi-Lo e serem curados. Em poucas e práticas palavras faz seu ensinamento. Conhecia muito bem nossos relacionamentos e como nosso coração se embaralha por não saber seu lugar. Ele nos coloca diante de nós mesmos para que possamos nos conhecer e tomar atitudes coerentes na convivência fraterna. Aplica bem a situações concretas que se fixaram na comunidade: Um cego não pode guiar outro cego; o discípulo não é maior que o mestre; o cisco no olho do irmão; a árvore é reconhecida pelos frutos; não se colhe figo de espinheiro; o homem bom tira coisas boas de seu coração; a boca fala do que o coração está cheio. Podemos entender nesse texto evangélico a necessidade de ser bom na comunidade. Para guiar os outros é preciso ter sabedoria, como mestre. E exemplifica dizendo que, se não formos bons não daremos frutos bons. Somos um espinheiro. É preciso ter um bom coração para ser mestre. Esse sim, tem uma riqueza muito grande a contribuir na comunidade. Assim se tem uma vida como um cedro que floresce na casa do Senhor. A vida da comunidade não depende de boas estruturas, de boas reuniões e técnicas, que muito ajudam, mas da profundidade da vida de cada um de seus membros. Aprender o bem viver é dar vida ao próprio coração. Cada um reconhecendo as próprias limitações poderá dar uma excelente vida aos irmãos. 
O coração cheio de vida 
Jesus, como conhecia a vida e o coração das pessoas e, sabia o que o homem tem em seu coração (Jo 2,24), tinha condições de falar com propriedade para rica a vida da comunidade. Não exige muito conhecimento, mas que sejamos capazes de criar uma excelente vida em comum. O escritor do livro do Eclesiástico também era conhecedor da pessoa e de seus relacionamentos, mostra que o homem se manifesta pela sua conversa. Por ela a pessoa se revela. Usa a bela imagem da peneira que separa o bom do ruim, separando os refugos. Os defeitos do homem se revelam no seu falar (Eclo 27,5). Esses eram provérbios que estavam na boca do povo. Jesus o usa: “O homem mau tira coisas más de seu mau tesouro. A boca fala do que o coração está cheio” (Lc 6,45). “Como o forno prova os vasos do oleiro, assim o homem é provado em sua conversa. A Palavra mostra o coração do homem” (Eclo 27,6-7). Regras não regulam uma comunidade, mas sim o coração. Jesus propõe as bem-aventuranças para que os seus possam viver intensamente a vida da comunidade. Procuramos fazer muitos esquemas de vida, mas somente as bem-aventuranças podem nos dar a certeza de um caminho seguro. 
A morte foi tragada 
Paulo encerra a primeira carta aos Coríntios com a reflexão sobre a certeza da ressurreição de Cristo, garantia de vitória sobre a morte e ressurreição de todos. O futuro de todos está garantido na simplicidade da vida nova, no corpo ressuscitado. Cristo venceu a morte. E essa não tem mais domínio, nem mesmo sobre o homem. Como personificasse a morte, diz que essa usou do pecado para que a morte dominasse. Ela espetava a humanidade. Paulo convida todos a “serem firmes e inabaláveis, empenhando-vos cada vez mais na obra do Senhor, certos de que as vossas fadigas não são em vão, no Senhor” (1Cor 15,58). A fé não é somente crer em uma doutrina, mas, dela, se deve tirar as direções da vida no cotidiano. Crer na ressurreição justifica ter um coração vivo no Senhor. 
Leituras: Eclesiástico 27,5-8; Salmo 91; 1 Coríntios 15,54-58; Lc 5,39-45 
Ficha nº 1836 - Homilia do 8º Domingo Comum (03.03.19) 
1. O texto do evangelho é um convite a sermos bons para que a comunidade seja boa.
2. A pessoa fala do que tem no coração. Dali é que sai tudo o que o homem é. 
3. Crer na ressurreição justifica ter um coração vivo no Senhor. 
De boca fechada 
Às vezes a gente diz que uma pessoa é bela, mas não deixa que abra a boca, pois pode sair muita asneira. É o pensamento das leituras de hoje. Jesus é claro: A boca fala do que o coração está cheio (Lc 6,45) e o homem é provado pela sua conversa (Eclo 27,6). Diante dessa verdade, somos convidados a olhar nosso interior para que nossas palavras tenham direito a uma fonte melhor. Vivendo bem, as palavras se tornam um ensinamento. Quando dizemos que um pregador não consegue dizer nada, é porque seu coração não tem nada. Pior, só tem o que não precisa.